sábado, 23 de outubro de 2010

Diálogos sobre Justificação

figura_01 Do Blog de um colega do Orkut (leia em Investigação Filosófica) foi afirmado que qualquer justificação de P teria que trazer como conceito a impossibilidade de não-P. Esse, sem dúvida, seria o melhor dos mundos e nas ciências naturais é muito provável que encontremos inúmeros exemplos desse tipo de justificação. Inclusive penso que o falseamento popperiano traz em seu bojo esse conceito desde que Popper se virou contra o positivismo. Porém Popper foi mais prudente, pois não precisamos “provar” nem demonstrar a impossibilidade de não-P. Basta que deixemos em aberto que se não-P existe, então P é falso. Pronto, estabelecemos com isso uma verdade provisória da afirmação de P. Penso que seja um critério mais lógico e possível que o do Rodrigo Cid.

O cerne da discussão parece-me ser a questão do que torna uma afirmação uma verdade indubitável. Não uma possibilidade de verdade, mas sim uma verdade total, diria até absoluta. Mas o que dá para concordar com o que foi dito?

Infelizmente a realidade não é tão “preto no branco” assim. Tudo seria mais fácil se fosse e por “precisar” ser mais fácil para uma maior previsibilidade, o ser humano foi pródigo em determinar que o mundo fosse sim “preto no branco” (e isso aconteceu até na esfera racial). Parece que assisto apenas uma inversão do positivismo, onde sua negação traz os mesmos vícios que o tornou o que é. É um paradoxo absolutista.

Em suma, se P só pode ser justificado pela impossibilidade de não-P, em tese poderíamos dispensar as razões de P existir? Percebem as conseqüências disso? Ou seja, posso justificar qualquer sandice desde que demonstre e justifique que a não-sandice seja impossível. Soa-me estranho, confesso. Pode até ser que eu não esteja alcançando o nível de raciocínio dos membros do Blog, mas soa-me realmente estranho.

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sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Religiosidade do Brasileiro e as Eleições

Curioso ver que somente depois da criacionista Marina Silva sair da disputa é que a questão religiosa virou tema político na eleição para presidente no Brasil. Com quase 20 milhões de votos, Marina não apelou para seus correligionários evangélicos em nenhum momento, ao passo que assistimos Serra e Dilma se estapeando e trocando acusações para que não desagrade essa parcela da população.

Em entrevista À BBC Brasil, Marina disse:

Somos um país onde mais de 90% das pessoas creem em Deus, e esse é um dado de realidade que não se pode negar. No entanto, precisamos ter a sabedoria de não importar conflitos religiosos que existem em outros países para o Brasil, onde temos cultura de respeito pela diferença e pela diversidade. Mas o respeito pela diferença e pela diversidade pressupõe o direito daqueles que são evangélicos ou católicos de afirmarem os seus pontos de vista.

marina1Eu gostaria muito de saber o que significa e qual a amplitude desse direito de “afirmarem os seus pontos de vista”. Por acaso, para Marina Silva, se ao meu ponto de vista estiver agregado propagar e disseminar preconceito contra homossexuais e/ou contra outro gênero, então eu tenho direito? Pois é esse o direito que grande parte das denominações cristãs querem ter: o de dizer e instruir a todos que homossexuais vão para o inferno e que, sob os olhos de Deus, amar alguém do mesmo sexo é abominável e torna o cidadão um ser de segunda categoria.

Ela diz que o respeito pela diferença e pela diversidade pressupõe o direito dos religiosos de afirmarem os seus pontos de vista. Claro que sim. Mas pressupõe mais coisas. Antes dessa pressuposição existe uma outra pressuposição: qualquer afirmação daquilo que se pensa não pode cercear o direito do outro em ser o que é, seja diferente da maioria ou não.

Ora, por que essa senhora (que hoje tem um peso considerável nas mãos para apoiar Dilma ou Serra) não pressupõe também esse fato? E por que os covardes Serra e Dilma, ao invés de se estapearem para mendigar voto religioso não usam da coerência que precisamos ter para o próximo governante desse país?

Direito à diferença e à diversidade não significa direito em invadir o direito do diferente e do diverso. Isso é tão óbvio que chega a doer. Impedir alguém de discriminar o diferente, não é cercear o direito à discriminação, mas garantir que o diferente possa ser o que é sem ser tolhido.

Um Estado Laico precisa garantir o direito das pessoas. Os gays não reivindicam o direito de falar mal dos evangélicos, apenas querem o direito de serem quem são sem terem de ser ofendidos e condenados ao inferno por esses “detentores da verdade”. Os evangélicos reivindicam o direito a discriminação e a proferir a condenação de pessoas que são diferentes deles. Ora, quais direitos legítimos aqui estão em jogo?

Não basta para os religiosos que os que crêem não façam aborto ou sejam heterossexuais. Eles precisam legislar sobre a vida daqueles que não comungam com eles das mesmas crenças. Eles precisam controlar e impedir a homossexualidade e o aborto mesmo daqueles que pensam diferente deles. Eles precisam que a sociedade toda pense e acate suas crenças, com pena de ser condenada ao inferno e discriminada como criminosa ou doente.

Quantos crimes e doenças não se proliferou na história da humanidade em busca de uma totalização de comando e crenças?

Para se pensar…

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quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Moralidade e Verdade

Reflito sobre uma leitura que fiz de Habermas:

Por outro lado, a verdade de uma proposição expressa um fato, no caso dos juízos morais não há nada que equivalha à afirmação de que um determinado estado de coisas ‘é’. Um consenso normativo, formando em condições de participação livre e universal no contexto de um discurso prático, estabelece uma norma válida (ou confirma sua validade). A ‘validade’ de uma norma moral significa que ela ‘merece’ o reconhecimento universal em virtude de sua capacidade de, por meio da razão somente, obter o consentimento da vontade daqueles a quem se dirige.” (HABERMAS 2007, p. 65-66) [i]

habermasCom isso ele diz que a única forma de substituir a referência ontológica a um mundo objetivo é, em nós, na qualidade de pessoas morais, afirmarmos os sentidos morais por meio de uma construção conjunta, dialogada. Eu concordo com ele e com o sonho de uma democracia plena que nos dê livre acesso à construção conjunta do discurso racional que escolheremos permear nossas vidas e nossos destinos.

Porém e, infelizmente, isso me soa utópico. Enquanto houver aqueles que delegam a outrem o seu co-pertencimento à sociedade, enquanto houver alguém que aliena as decisões sobre sua vida e deixa-se oprimir para ser representado por grupos, associações, clubes, governos e ideologias, sempre haverá uma referência ontológica para a moral e para o mundo objetivo.

São esses grupos que determinam as coisas como devem ser e as pessoas como devem ser e agir. Eles determinam o espírito, o fundamento e a finalidade do mundo de acordo com seus interesses; inclusive dando respaldo metafísico para isso. Eles contam não só com a alienação das consciências individuais a seu favor de forma voluntária, mas usam de seus instrumentos coercitivos para angariar quem se aliene a favor de suas idéias, excluindo e discriminando quem não concorda ou pensa diferente.

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