terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Rex Extensa e Res Cogitans

Esse pequeno artigo foi originalmente publicado na Conecte (Blog da Associação Brasileira de Neurociências e Comportamento) em 10 de Outubro de 2009, podendo ser lido no original aqui: Rex Extensa e Res Cogitans. Reproduzo aqui no Blog por dois motivos: primeiro o orgulho de ter sido aceito um artigo meu em uma instituição que não é minha especialidade e nem minha área, trazendo uma reflexão filosófica a partir de Merleau-Ponty para as questões neurocientíficas. Sabemos que seus estudos contribuíram para o resgate de um monismo na questão mente-cérebro. Segundo é que já venho escrevendo sobre Ponty em alguns posts e esse vem a complementar meu estágio atual de estudo sobre esse filósofo fantástico e até relativamente pouco conhecido.

Vamos ao artigo…

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Uma nova filosofia, a filosofia do olhar, acontece quando se toma, historicamente, a inseparabilidade entre a Rex Extensa e a Res Cogitans, começando então um estudo de seu imbricamento no fenômeno humano. Em Vigiar e Punir Foucault nos diz que não é o corpo a prisão da alma. Se pudermos falar em prisões aqui, é justamente é a alma a prisão do corpo.

O Mecanicismo e o naturalismo nos fez perder a consideração de uma pluralidade de sentidos e uma diversidade de perspectivas possíveis que Merleau-Ponty tenta resgatar através de um exame minucioso da corporeidade e de suas relações e imbricamentos com as representações mentais que fazemos do mundo.
A realidade, para Merleau-Ponty, é inexaurível, inesgotável. Uma profusão de modos e fundos que se sobrepõem aos sentidos e que nos faz mergulhados em um mundo que a mente precisa categorizar para entender, e entender para extrair para si a utilidade da qual a consciência se intenciona e se volta.

Mas é então, nessa categorização mental, que temos a ilusão do entendimento. E se acreditamos entender, não pode haver nada mais além do que foi entendido, senão não foi entendido. E assim promovemos a cisão entre o que a mente percebe e o que o corpo nos diz. A mente prende o corpo, aprisiona tudo aquilo que vivencia e experimenta para nomear como realidade só aquilo que ela se dá como satisfeita nas categorizações que faz. É o reducionismo que nos traz tanta prisão.

A grande pergunta que se impõe, portanto, é: de que forma a mente se prende em suas categorizações se constituindo na prisão do corpo e como podemos fazer com que ela se abra para o que o corpo nos teria a dizer sobre o mundo? Como romper essa dicotomia entre corpo e mente nos vendo mais totais?

A neurociência teria muito a nos dizer se também pudesse nos ver mais totais do que simplesmente nos ver como efeito de uma causa mecânica. Em algum lugar entre a mente (como epifenômeno de processos físico-químicos) e os próprios processos corporais sintetizados no cérebro, antes de qualquer representação que essa mente produza, um Sujeito pré-consciente. Essa hipótese seria plausível?
Nas decisões que tomamos na ilusão de que somos conscientes de nosso ato decisório, há um processamento fora do limiar de nossa consciência, mas que de alguma forma, delibera em função de algo. Encontrar esse “algo” pelo qual todo nosso mecanismo corporal e representativo-cognitivo toma decisões antes mesmos de termos consciência dela, talvez seja o grande Graal filosófico-científico da contemporaneidade.

Onde ele estaria? Haveria, em alguma instância, a possibilidade real de um arbítrio livre? O que é ser livre?

by Gilberto Miranda Júnior in Rex Extensa e Res Cogitans no Conecte.
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A questão do livre-arbítrio e da liberdade é muito ampla e futuramente gostaria de trazer algumas reflexões sobre isso no Filosofando na Penumbra.

É isso. Um ótimo 2010 a todos.

2 comentários:

Angelillo disse...

A veces me da la sensación que M.P. y la postura fenomenológica es el gran olvidado en los actuales debates mente-cerebro (desde la filosofía anglosajona, claro)...
En fin, obrigado por la exposición de este autor en tu blog. Es una maravilla!!!!

un saludo...

(E desculpa, nao sei escrever bem em portugues o brasileiro, por isso, eu o fago na mea lingua).

Gilberto Miranda Jr. disse...

Angelillo, eu que agradeço sua leitura e por me dar retorno sobre o impacto do que escrevo sobre quem lê. MP é um grande filósofo e traz a matéria prima para um renovado pensar sobre a existência.

Abraços...

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